domingo, 12 de junho de 2011

"Eu sei, mas não devia."

"Eu sei que a gente se acostuma. Mas não devia.", já dizia a minha amada Marina Colassanti em um texto brilhante chamado "Eu sei, mas não devia". Eu sei que a gente se acostuma, mas não devia... A gente se acostuma a ser humilhada, a ser rebaixada, a ser diminuída. A gente se acostuma a não ter uma relação saudável, a ser deixada de lado, a ser a segunda opção - ou última. A gente se acostuma a dar tudo de si e não receber nada em troca. A gente se acostuma a não ser amada, a não ser desejada, a ser simplesmente usada. A gente se acostuma, mas não devia.

Fico pensando nisso... nas coisas a que nos acostumamos. E não sei ao certo por que as aceitamos. Por que aceitamos permanecer em um relacionamento sem futuro? Por que aceitamos que nos magoem ? Por que aceitamos que o errado seja visto como certo? Por que aceitamos que, em meio a tanta dor, tenhamos que fingir felicidade? Não sei...

Sobre o que eu estou falando, afinal de contas? Estou falando, dentre outras coisas, sobre aquela amiga que tem um namorado que só a magoa, mas que ela não deixa. Estou falando sobre aquela amiga que não tem coragem de dar um basta naquele relacionamento sem futuro. Estou falando sobre aquela amiga que aceita que o seu namorado saia com outras meninas, porque, para ele, ele não é namorado de verdade, oficial. Estou falando sobre permitir que as pessoas entrem nas nossas vidas e permaneçam de uma forma não saudável. Permaneçam e nos façam mal. Nós permitimos, nós acostumamos e nós aceitamos. E, o pior, nós achamos normal. Ou passamos achar.

Achamos normal a mágoa, achamos normal o descuido, achamos normal o desrespeito. Achamos normal não receber o valor que merecemos... e achamos isso, talvez, porque no fundo, achamos que não merecemos mesmo. Aceitamos receber toda a podridão do outro, porque nos vemos, mesmo que inconscientemente, como lixeiras e como seres inferiores àqueles que nos machucam. E não somos. Mas é difícil perceber e aceitar isso... Afinal, estamos tão acostumadas a isso, que não percebemos mais o que seria o certo...

Começamos a usar vendas que nos impedem de ver a realidade. A gente mascara a dor como se desta forma pudéssemos passar a suportá-la. E de fato funciona. A gente se esconde por trás de desculpas do tipo "eu não me importo", "ele não faz por mal" ou "é o jeito dele" para fingir que é certo o que não é. Usamos as desculpas para tentarmos NOS convencer de que aquela dor é normal. Porém, no fundo, lá no fundo, a gente sabe que não é. Todo mundo sabe quando está sendo usado, todo mundo sabe quando uma palavra fere, todo mundo sabe onde o coração dói nas horas de solidão... Todo mundo sabe, mas ninguém, ou quase ninguém, tem peito pra enfrentar essa dor e dizer chega, basta.

Dar um basta significa sair da zona de conforto. Significa partir rumo ao desconhecido. Significa trocar a segurança do concreto pela insegurança do que há por vir. Mas e daí? Dar um basta também significar se amar mais, se valorizar mais, se descobrir mais. Significa se reconhecer como alguém que merece ser amada de verdade, ser valorizada, ser respeitada. E por que não fazemos isso então? Porque mudar, desacostumar dói. Dar um basta significa passar um tempo de luto, passar um tempo de carência, passar um tempo de encontro consigo mesma... É difícil aguentar a dor sozinha quando se está acostumada à dor com o outro.

A gente se acostuma, mas não devia. A gente não devia se acostumar com o que nos maltrata, com o que nos faz infeliz, com o que nos machuca. A gente devia sim, se acostumar com a felicidade, com o direito de ser feliz incondicionalmente e acima de tudo. Com isso sim... Mas o que fazer quando não vemos que aquilo não nos faz bem? O que fazer quando achamos que o errado é o certo na nossa vida? Pare. Pense. Pese. Meça. Reveja atitudes, lágrimas e sorrisos. E analise: o que você quer e espera pra sua vida? Vale realmente a pena continuar ? Isso, só você pode decidir, mas seja sincera... E se for preciso mudar, mude. E desacostume-se já com a infelicidade - ou será que devo chamar de "falsa felicidade". A partir de agora.

"A gente se acostuma a coisas demais, para não sofrer. Em doses pequenas, tentando não perceber, vai afastando uma dor aqui, um ressentimento ali, uma revolta acolá. (...) A gente se acostuma para não se ralar na aspereza, para preservar a pele. Se acostuma para evitar feridas, sangramentos, para esquivar-se de faca e baioneta, para poupar o peito. A gente se acostuma para poupar a vida. Que aos poucos se gasta, e que, gasta de tanto acostumar, se perde de si mesma."

9 comentários:

Francisco Neto disse...

Excelente mensagem, gostei...

Att.,
Profº Francisco Netto.

Adriene disse...

Eeee texto bom.
Lendo percebi q eu realmente não me acostumo com o q não é bom.Bem é verdade q as vezes aquilo q não "presta"chama mais atenção.
Mas o bom de se amar em 1 lugar é ter o discernimento para realmente perceber o q eu qro q faça parte da minha vida.

Anônimo disse...

Difícil sair da zona de desconforto...É a lei da Inércia!!Adorei, Bjos Carol

Elem disse...

Difícil mesmo é sair da zona de conforto, Carol... De desconforto é mole! hehehe

Vivi Eyng disse...

Texto perfeito!

Realmente às vezes ficamos presas a tal zona de conforto por um tempo...

E este tempo varia de pessoa para pessoa... para uns dura pouco, para outros dura mais... e para alguns pode durar pra sempre... é o risco de se acomodar...

Mas quem já esteve amedrontada em uma destas zonas sabe que é possível sair... ainda que neste momento (o da saída...) a gente sinta uma dor imensa, que dilacera (e não adianta mentir, não passa rápido... demora...)...ainda assim... vale a pena!
Vale a pena largar tudo... chutar o balde... chutar o pau da barraca... ligar o botão do foda-se e entregar-se ao que está por vir após a tempestade...

Sabe quando um dia chuvoso chega ao entardecer com aquela abertura de sol? É assim que a gente se sente quando saí da zona de conforto... a chuva lava a alma e o sol faz nascer a esperança de fazer a nossa vida diferente.

Vale a pena!

Beijos...

Anônimo disse...

Olá Elem,

Partilhamos o mesmo pensamento sobre o "costumo para não sofrer que leva ao sofrimento"!

E sei. E devia! Só consciente é possível ser feliz.

Grande beijo para ti!

http://omundoparachamardemeu.blogspot.com/

A.S. disse...

Elem,

Belissimo o teu texto... e tão verdadeiro!
Acho que esta frase tua é eloquente:

... "Que aos poucos se gasta, e que, gasta de tanto acostumar, se perde de si mesma."


Beijos meus!
AL

Elem disse...

Obrigada pelo elogio...
A frase citada não é minha... faz parte do texto da Marina Colassanti - perceba que o último parágrafo está entre aspas =)

Volte sempre! =)

Patrícia Pinna disse...

Excelente texto!Concordo plenamente com o escrito!Em tudo.
Realmente, sair de uma relação onde estamos em oscilações quase diárias, é muito difícil, até mesmo porque a pessoa vai querendo resgatar o que era de muito bom, dizendo que no início não era assim, e que fulano tem seus erros, mas é uma excelente pessoa.
Só que isso não basta para viver a dois,então você vai ficando insatisfeita, satisfeita,risonha , triste, a cada migalha que a pessoa te der, a cada manifestação do amor e respeito de outrora, daí você acaba achando que pode ter jeito, e acaba então se submetendo às coisas ruins, atribuindo tudo isso ao momento que a pessoa esteja atravessando, ou então, levando a culpa toda para si mesma, o que é pior, pois ninguém erra sozinho.
Quando percebemos que o desgaste está muito grande, e que estamos sufocadas, tomamos então uma atitude, que não tem um tempo específico para acontecer, porém ela acontece em sua maioria, pois ninguém gosta de ficar sofrendo, e os que ficam, é porque ou acreditam demais na mudança do outro, ou porque querem mudar, ou porque acham que não te escolha, ou porque estão pagando por algo que fizeram no passado.Não necessariamente precisa ter sido com a pessoa em questão, porém a Lei do Retorno é implacável.
Bem, a pessoa pode quitar e com certeza quitará as sua dívidas, porém, não precisa ser para a vida toda.
Erramos, quitamos,e livre dos nossos débitos, estaremos prontos a recomeçar, a amar, e sermos amados, com respeito e esperança em dias melhores, numa renovação, numa segunda chance que a Vida nos dá.
Grande beijo!